quarta-feira, 27 de março de 2013

Livro de antimemórias, vol. IV, p. 357







Não que coubesse em palavras, via-se uma longa trilha de cadáveres de significantes atrás de passos de suave ferocidade, mas veio para falar sobre pântanos e icebergs. Algo que não ficara claro precisava ser intensificado até ser alcançado o limite de obscuridade completa. Suas mãos coreografavam uma dança negra e nervosa como se pudesse alargar hiatos e reticências com o fogo de fonemas desconhecidos. Tudo o que não fora dito para sempre petrificado, todas as possibilidades dissipadas em fendas. Nas listas horizontais da saia, planetas saturninos fugiam a órbitas assassinas. O que ela dizia logo caía espatifado em mil pedaços que escapuliam como baratas. De nada adiantaria juntar os hieróglifos em papéis rasgados que fermentavam no chão. Um manequim talvez guardasse mais elegância, ritmo, fluência, embora perdesse em graça e eficácia. A sacerdotisa de Delfos não queria voltar para a ladeira do Leblon, permanecia plantada em sapatos rosa, relógio Cartier dourado, bolsa Gucci caramelada e  duas sacolas repletas de livros e material escolar. Não almejava vingança, apesar do ódio figadal. Tudo era a natureza oracular soprando forte em seus cabelos.


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