quarta-feira, 26 de março de 2014

Etilírico

Gravura de Isabel Pons









































Lua insólita,
sólido monólito,
em meus olhos
inchados de álcool
dois móbiles
de granito.

Aos nautas que morrem na praia

















Nos lados líquidos
da cidade
camadas de algas
sabem muito bem
que não merecemos
o mar.


terça-feira, 25 de março de 2014

A arrastada

Andréia Tolaini (imagem do blog thinkolga.com)


  









Para Cláudia da Silva Ferreira

Quando os nomes são
alvos
a bala que alveja
o anonimato
mesmeriza o mesmo
trajeto nas letras
de manchetes
a multiplicar a invisibilidade
de mulher negra
com adjetivo-espetáculo
em que se irmanam
tantos escribas e assassinos
na língua siamesa

Crime a várias mãos
múltiplas sobrepostas perfurações
num único corpo
a.r.r.a.s.t.a.d.o.
por balas policiais
jornalísticas
legais
políticas
como outros tantos
sacos de carne humana
descartados
em notícias falsas


sexta-feira, 21 de março de 2014

Silêncio por excesso de palavras

Trabalho da artista alemã  Rosemarie Trockel


















Floração
de poesia-ferrugem
proliferação
feroz
conversão
de afasia
em prolixidade
plurideplorável
oxidação
da linguagem.



quarta-feira, 19 de março de 2014

Poemas em Germina


Contingente, trabalho de Adriana Varejão



Doze poemas do meu livro Anarquipélago foram publicados na edição atual da Revista Germina - Revista de Literatura & Arte.

domingo, 16 de março de 2014

Caderno de rascunho

















O lugar onde
nada acontece
ainda
apenas o risco
de (fora da linha)
a palavra
(que não virá)
acontecer


O lado de fora do poema

















não se abre
ao fechar-se um livro
como alguém
que batesse portas
e selasse janelas
entre aposentos distintos

é preciso
um certo tempo
para alcançarmos
o que vive fora
do poema
um tempo precioso
inesgotável
e isso é tão verdade
que morremos
antes de descobrir
se algo realmente existe
fora do poema


sexta-feira, 14 de março de 2014

meninos de rua

Este poema é da década de 70 (não sei de que ano), época em que eu imprimia em mimeógrafo e vendia os textos nas ruas. A poesia, então, era a minha arma. É dedicado aos meus companheiros de fuga Jorge, Sebastião e Filipe. Que sejam felizes onde quer que estejam.



sábado, 8 de março de 2014

do barril à caçamba


Baticum


Basta
um tambor
para ínfimo farol
se acender
no peito.


Poema

Pintura de Daniel Senise




















Abrir a lâmina da pupila,
sair do papel, reter
do tempo a parte queimada,
segurá-la e as asas
– obrigá-las ao sossego.
Silenciar por segundos
como antes de um crime,
não mais quebra-gelo
demolindo moinhos de vento.
Cena estática e nua;
momento de repouso,
descanso de equilibrista,
instantâneo no bolso furado,
fotografia de um minuto
destilada no olhar descrente
de todos os outros minutos da vida.


28.04.77

quinta-feira, 6 de março de 2014

Cisão


























Guardar-se
a carne
para o câncer
alastrar
no  espírito
selva
de antilogias.

Linguagem
antimofo
antimetáforas.

Depois
da chuva
caligrafar
lou
       cura
                  liberdade
de dizer
o que não
pode ser
a não ser
que


              

terça-feira, 4 de março de 2014

Poema em Mallarmargens




Meu poema-potlatch foi publicado em Mallarmargens - Revista de poesia e arte contemporânea

http://www.mallarmargens.com/2014/03/poema-potlatch.html

CARNOSWALD

Pablo Picasso - "Les Demoiselles d'Avignon" - 1907





















As minas da gare
peladinhas
peludinhas
caíram na alforria.


A foliã

Imagem: tapa-sexo pertencente à cultura marajoara.























Persegui uma foliã,
eufórico,
como Hércules
em luta contra Hidra,
no meio da multidão
contraída.

O bloco
prolongava o paraíso,
eu,
na contramão,
perdi o gás e o juízo.

A foliã,
soltando faíscas,
sumiu
com o tapa-sexo
na fotosfera.