Não hai nem kai
I
A letra h cai;
onda muda do verão
apaga o som da água.
onda muda do verão
apaga o som da água.
II
Bem-te-vi pousado
no telhado azul da tarde
alta, pura hipnose.
Bem-te-vi pousado
no telhado azul da tarde
alta, pura hipnose.
III
Calor e formigas.
Colar no círculo escuro
cantos de água clara.
Calor e formigas.
Colar no círculo escuro
cantos de água clara.
IV
As folhas em breve
asas saídas de árvores
abrirão o outono.
V
Em ocaso fúcsia
o dia se despe do azul.
Lanternas noturnas.
VI
Mil máscaras mortas,
som e fantasias sepultas,
sonhos, sombras, cinzas.
VII
Rasura nas nuvens
o sol. Um sorriso imenso
lava-se na chuva.
Rasura nas nuvens
o sol. Um sorriso imenso
lava-se na chuva.
VIII
Peixe morto espia
copos, pratos, mudo espanto.
Mesa da miséria.
Peixe morto espia
copos, pratos, mudo espanto.
Mesa da miséria.
IX
À beira de um rio
a água avisa às rugas:
som de sal e foz.
X
Como sem as asas
riscar no papel azul
o salto no caos?
XI
Gatos algemados.
Salas ou jaulas urbanas.
Convívio de extremos.
XII
A cobra sob juncos
e a malícia sem remorso
revolvem-se em vão.
XIII
Gérbera, glicínia.
Nome e perfume de Deus
moram em qual flor?
XIV
Árvores cortadas,
ferrugem em galhos verdes.
Cavar o deserto.
XV
Vento nas paredes,
no rebanho, nas colinas.
Bombas sobre aldeias.
XVI
Tecnozumbis pousam
mouse e maletas vazias
como suas cabeças.
XVII
Mais-valia, valises,
cuecas, aviões, Suíças:
país ou deserto?
XVIII
A noite, ao abrir-se,
é rascunho de pecados,
móvel cicatriz.
XIX
Ondas, ondas, ondas.
O surf lava a alma na prancha.
O mundo, um balé.
XX
Sou mar e carvão.
A lua chora no meu ombro,
as ondas também.
XXI
A última palavra
poderá ser a primeira
letra do deserto.
Hai cais metaforicamente fantásticos!
ResponderExcluirParabéns! Abraço da Célia.