quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Despejo




Quando fui expulso do Estácio, em 1975, era a remoção de todo um bairro para a maravilha do Metrô. E fomos todos para Antares, Urucânia, Paciência e a puta que pariu, em casas falsas inspiradas em acampamentos palestinos. Os administradores da cidade sempre ofereceram espelhos e miçangas, além de um conjunto de frases feitas que nunca chegaram à última sílaba. O progresso é irrefreável, mas o desrespeito às pessoas é inevitável? Irrefreável e inquestionável formam mesmo uma rima estranha. Por exemplo, rimam com o morro do Bumba, casas sobre aterro sanitário? Quem desapropria o faz em benefício de quem? Progresso para quem? O que é progresso? Ampliação da mais-valia? Bantustões para turistas, aluguel de laje no Vidigal? Formação de nômade-lupemsinato para eleições viciadas? Ingresso automático em facções criminosas, já que a esquerda desistiu de lutar? As cidades cada vez mais um gigantesco balcão de negócios onde a população só merece respeito quando aumenta o faturamento de seus verdadeiros donos, sempre acompanhados pelos hediondos cães de guarda.

Fiz esse poema em homenagem a meu amigo Maurício, da favela de Antares que morreu em confronto com outra gangue e eu sequer me lembro do ano, e a todas as pessoas que já tiveram a porta de casa marcada para demolição.

Despejo

Nosso lar
não é mais nosso
logo um shopping
ignóbil
colosso

nossos móveis
nossos ossos
no caminhão de entulho

a copa do mundo é nossa
por que não sentimos orgulho?





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